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Por Ricardo Moreira Nascimento*
Os MLS (Multiple Listing Service) são sistemas de listagem de propriedades que permitem aos corretores de imóveis compartilhar informações sobre propriedades à venda. Característica central do mercado imobiliário nos EUA, desempenham papel fundamental na facilitação das transações imobiliárias.
Uma propriedade disponível para venda no MLS está associada a um único corretor, o que contribui para evitar a duplicidade de agentes e garantir a veracidade das informações. Portais como o Zillow, considerado um dos maiores marketplaces imobiliários em solo norte-americano, se conectam aos 700 MLS existentes hoje por lá e, assim, um comprador tem a oportunidade não apenas de ver o que há disponível, como ainda saber o histórico de transações daquele imóvel.
O mais interessante é que 90% das transações acontecem em parceria entre imobiliárias, ou seja, quem atende o comprador é uma imobiliária e quem atende o proprietário é outra. Assim, se você pergunta a um corretor americano quanto é a comissão, ele vai falar 3% e não 6%…
Ultimamente, tenho visto várias pessoas sugerindo nas mídias sociais que os MLS poderiam ser a “tábua de salvação” para tornar o nosso mercado imobiliário mais líquido e confiável. Eu discordo totalmente e vou explicar o porquê.
Ao contrário do que muita gente pensa, os MLS foram criados no final do século XIX. Ou seja, já existiam antes mesmo de um computador surgir e, por isso, não carregam de fato tecnologia em sua gênese.
Fora os EUA, apenas o Canadá tem realmente um MLS. Portugal, Espanha, Suíça, Noruega, França e Alemanha não têm e lá não é a bagunça que vemos aqui no país.
No Brasil, já tivemos várias iniciativas neste sentido. Em 2001, quando fui CEO do Planetaimovel (hoje ZAP), em parceria com o SECOVI-SP, criamos o SIEX (Sistema de Imóveis Exclusivos). Em termos de tecnologia, era exatamente igual ao MLS. Pouco depois, em 2005, tentamos novamente com o saudoso Elbio Fernandez Mera, então VP de Comercialização do Secovi-SP. Foi criada a Rede Secovi, que tinha o mesmo objetivo: a cooperação entre empresas e corretores para criar um sistema de imóvel único e parcerias na venda.
Nenhuma dessas iniciativas deu certo.
A razão principal é que todo mundo achava uma boa idéia, mas queria ser o último a entrar. Costumo dizer que ninguém queria ser o piloto de teste, porque boa parte das imobiliárias não têm confiança entre elas mesmas. Ou seja: “Deixa o meu amigo ir na frente que, se realmente dividindo comissão vou faturar mais, pois não quero pagar pra ver”.
Em resumo, não é uma questão de tecnologia, mas de comportamento. A falta do sistema (MLS) não é a causa da bagunça. Todos têm uma parcela de culpa nessa zona: proprietários não confiam no corretor, comprador não confia no corretor, e o corretor não confia nem no comprador nem no proprietário. Por que existe esta falta de confiança? É a “Million Dollar Question”.
Algumas hipóteses:
- A barreira de entrada para se tornar corretor é muita baixa em termos de custo, pré-requisitos e avaliações. Sei que é polêmico. Conseguem imaginar se medíssemos a capacidade de alguém se tornar corretor de imóveis com a mesma régua que usamos para o corretor de seguros?
- A profissão de corretor de imóveis é regulamentada há 61 anos e temos no Brasil hoje cerca de 600 mil profissionais registrados segundo o Cofeci (Conselho Federal de Corretores de Imóveis), muitos atraídos pela promessa de ganhos rápidos a cada venda fechada.
Papel das entidades
Nos EUA, se você quiser ser um “Agent”, vai desejar obter uma inscrição junto à NAR (National Association of Realtors). Repare, “inscrição”. Assim, ganhará o direito de se denominar um REALTOR, termo cunhado pela entidade. Os americanos, como sempre, provando que são bons de marketing…
Na Suíça, assim como em outros países, não existe sequer a necessidade de tirar um certificado/licença para intermediar imóveis. Na maioria das vezes, quem atua como corretor opta por se inscrever em alguma associação.
No meu ponto de vista, hoje essas entidades no Brasil assumem um papel fiscalizador e está mais do que provado que não funcionam para melhorar o problema desta falta de confiança. Aqui no Brasil, estima-se que mais de 50% das transações não passam por um corretor, enquanto nos EUA 98% passam. E o corretor não tem uma reputação boa só porque existe um MLS lá…
Não é colocando outdoor “Imóvel Só com Corretor” que vamos mudar esse percentual no Brasil, mas, sim, melhorando a reputação e a relação de confiança entre as partes.
Eu tenho a humildade de dizer que não sei a solução, mas com certeza não é uma bala de prata. É algo que levará ainda muito tempo. Sei apenas que a solução começa na compreensão de que não é só alguém ir lá e criar um sistema.
Como a maior parte dos nossos problemas, é uma tarefa para múltiplos stakeholders e requer tempo, persistência e negociação. Soluções mágicas só no Halloween.
* Ricardo Moreira Nascimento é empreendedor referência em inovação no mercado imobiliário e fundador de empresas como Zap Imóveis e Kzas Krédito (Grupo Creditas). Também é co-fundador e atual CEO da PipeImob, proptech de gerenciamento de processos imobiliários.
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